O grupo angolano Boavida, constituído por quase duas dezenas de empresas, vai desinvestir na construção e reforçar a aposta na agricultura para enfrentar a crise, que pode ser obrigado a despedir até 800 pessoas este ano, diz o seu presidente, Tomasz Dowbor, um empresário que em 1995, em pleno período de conflito armado, apostou no imobiliário, agro-indústria, mineração, educação, saúde e bem-estar, entretenimento, turismo, comunicação e negócios.
Em entrevista à Lusa, o presidente e fundador do grupo, o polaco Tomasz Dowbor afirmou estar diante de circunstâncias económicas “que mudam constantemente” e que obrigam a “encontrar soluções empresariais” que se adeqúem a este contexto.
“A nossa possível redução de pessoal surge na sequência do contexto macroeconómico que não tem sido favorável ao ambiente empresarial”, declarou, explicando que o grupo tomou um conjunto de decisões que implicam cortar postos de trabalho, mas que irão “servir, sobretudo, para encontrar melhor eficiência de determinados negócios”.
A desvalorização do kwanza “afectou a economia de forma generalizada e reduziu o poder de compra, a capacidade de consumo”, explicando que “se a moeda foi desvalorizada cinco vezes as pessoas ficaram também cinco vezes mais pobres”.
O grupo emprega actualmente cerca de 4.000 pessoas, mas as dificuldades sentidas em algumas áreas vão forçar a reduzir o número de trabalhadores que Tomasz Dowbor estima entre 500 a 800 pessoas, ao longo do ano, “uma adequação necessária, que acompanha a falta de mudanças estruturais no país” e um ambiente empresarial pouco atraente para realizar investimentos.
A área mais crítica é a construção civil que está “em franco abrandamento” e “foi profundamente afectada” pela descida drástica da procura, tanto do sector público como privado.
Tomasz Dowbor estima que a procura, tanto no segmento habitacional como de áreas comerciais tenha caído 90%, obrigando a abrandar o ritmo das obras e das vendas.
“É um sector muito dependente das condições económicas do país. Compramos casas quando temos boas perspectivas de melhoria de vida, bons salários. Quando estamos em crise, não pensamos em investir. Por isso, temos de acompanhar as circunstâncias económicas e abrandar também”, notou, sublinhando que estas “são as medidas necessárias para continuar a caminhar de forma saudável”.
Estabelecido em Angola há mais de 20 anos, o fundador do grupo, que construiu vários condomínios na zona de Luanda e detém 18 empresas, vai encerrar duas indústrias ligadas à construção (fábricas de portas e janelas e esferovite).
Actualmente, o Grupo Boavida actua nas áreas do imobiliário, agro-indústria, mineração, educação, saúde, entretenimento, turismo, comunicação e a estratégia passa pela diversificação dos negócios, com uma aposta forte na agricultura para vencer as dificuldades da construção civil.
“É um sector de demanda continua”, destacou o empresário, sublinhando que “as pessoas vão estar focadas na alimentação produzida internamente, e não importada” por ser mais competitiva em termos de preço. Por isso, o objectivo é “concentrar esforços” no sector agrícola. Além da pecuária, o grupo tem também explorações agrícolas (frutas e legumes) no Caxito, província do Bengo.
Prepara agora um projecto de produção de farinha de mandioca “com uma escala relevante”, que vai ser desenvolvido mo Malanje, com recurso a uma linha de crédito, e deve iniciar a produção ainda este ano.
“Temos previstos 800 hectares de cultivo de mandioca para fabricar farinha”, uma ‘commodity’ usada na indústria farmacêutica e na produção de álcool, num investimento de cerca de 25 milhões de dólares (cerca de 23 milhões de euros).
A educação e formação são outras das áreas de interesse para Tomasz Dowbor.
O grupo criou um Instituto de Liderança, focado na capacitação de curto prazo “com ferramentas concretas para jovens desempregados” e uma escola primária e secundária com “propostas pedagógicas diferentes”.
Pessimista em relação a 2020, que encara como “um ano de sofrimento e sacrifício para a sociedade em geral e para os empresários em particular”, o presidente do Grupo Boavida acredita que Angola tem mais dois anos difíceis pela frente.
E defende que o Governo vai ter de tomar medidas económicas “mais drásticas” e que tragam “mudanças mais profundas: por mais que esta direcção seja boa e corajosa não traz os benefícios imediatos que se espera”.
Para o empresário, é necessário que as medidas possam trazer benefícios concretos para a população mais vulnerável, até porque o Governo irá enfrentar uma crescente pressão social.
Quando ao grupo, apesar das dificuldades, admite que a crise eliminou também boa parte da concorrência e pode ajudar a consolidar a sua posição empresarial.
“Estou confiante que vamos conseguir erguer uma ponte para ultrapassar este buraco”, vincou.
Folha 8 com Lusa